Elegante, versátil e internacional! Nascida em Estocolmo
em 29 de agosto de 1915, a polivalente atriz sueca Ingrid Bergman estaria
completando 100 anos de idade neste próximo sábado. Para não passar por essa significativa
data sem um registro, o Rotina Cinemeira presta homenagens a
esta formidável artista que, tanto no mundo do entretenimento quanto no
coletivo social, contribuiu muito com suas deliberadas opiniões e que, com o
seu talento e intrepidez, pôde atuar em uma dezena de filmes memoráveis, se
configurando como um dos maiores ícones da Sétima Arte e uma das mulheres com a
personalidade mais forte e independente do Século XX.
A atriz tem as suas bases artísticas fundadas principalmente
no teatro. Influenciada pela família e sobretudo pelo pai, Justus Bergman
(fotógrafo, boêmio e amante das artes), Ingrid acabou ingressando muito jovem
na Real Escola de Arte Dramática de Estocolmo, e antes mesmo que terminasse o seu
curso, já estreava nos cinemas de seu país a convite de empresários e
produtores do ramo. Em menos de cinco anos, Ingrid Bergman já tinha participado
de pelo menos dez produções do seu país, das quais mais se destacam “O Grande Pecado” (1935) de Gustaf
Edgren; e “A Mulher que Vendeu a Alma”
(1938) e “Esta Noite Contigo”, ambos
de Gustaf Molander.
Entretanto, o seu maior sucesso foi “Intermezzo” (1936), também de Molander, filme que chamou a atenção
dos grandes caçadores de talentos e executivos de Hollywood, profissionais que
acabaram levando a atriz para despejar todo o brilho de suas atuações em Los
Angeles na refilmagem “Intermezzo: Uma
História de Amor” (1939), dirigido por Gregory Ratoff e com Leslie Howard
no elenco.
A estonteante atriz sueca Ingrid Bergman (1915 - 1982) - Divulgação |
Nos Estados Unidos, Ingrid Bergman teve a oportunidade de
trabalhar com os mais conceituados e renomados diretores dos grandes estúdios
tais como Alfred Hitchcock (já nos Estados Unidos), George Cukor, Leo McCarey,
Sam Wood e Vincente Minnelli. Sua versatilidade também possibilitou com que
filmasse com os maiores expoentes do cultuado cinema europeu, dentre eles Ingmar
Bergman, Jean Renoir e Roberto Rossellini. A avalanche de talento, carisma e
habilidade da atriz permitiram que ela fosse reconhecida e premiada nos mais
importantes festivais de cinema no mundo, como o Globo de Ouro, nos Estados
Unidos; o BAFTA no Reino Unido; o César, na França; e o Festival de Veneza, na
Itália.
Ingrid Bergman também foi a grande homenageada da 68ª.
Edição do Festival de Cannes deste ano. A atriz, que foi a presidente do Júri
do renomado Festival no ano de 1973, teve, na edição de 2015, o documentário “Eu sou Ingrid Bergman” (2015) de Stig
Björkman exibido na Mostra Cannes Classics como parte das comemorações do
centenário de seu nascimento. Com uma série de entrevistas e com a reunião de materiais
inéditos como cartas, diários e fotografias de Ingrid, o filme faz um recorte aproximado
de sua intimidade revelando aspectos peculiares sobre as suas vidas familiar e
amorosa dando enfoque, sobretudo, nas relações afetivas com os filhos e com os companheiros.
Atrás apenas de Katharine Hepburn e empatada com Meryl Streep,
Ingrid Bergman é uma das maiores vencedoras do Oscar. Num total de sete
indicações, a atriz foi agraciada com a estatueta em três ocasiões: melhor
atriz por “À Meia Luz” (1944) de
George Cukor e por “Anastácia, a Princesa
Esquecida” (1956) de Anatole Litvak; e melhor atriz coadjuvante por “Assassinato no Expresso Oriente” (1974)
de Sidney Lumet. Entretanto, são três outros filmes que desenham e podem, numa
tarefa completamente impossível, “resumir” a carreira impecável que uma das mais
encantadoras e estonteantes damas que o Cinema teve o prazer de nos apresentar!
Confira as nossas indicações para o seu fim de semana:
Casablanca (Casablanca, Estados Unidos, 1942)
Direção: Michael Curtiz
Tratar da carreira de Ingrid Bergman em Hollywood (e no
Cinema, de maneira geral) sem reverenciar a sua atuação em “Casablanca” é um dever indissociável para todos aqueles que
dedicam um tempo para apreciar ou discorrer um pouco sobre a sua carreira. Após
o relativo sucesso de seu segundo “Intermezzo”
e de atuações limpas em “Fúria no Céu”
de W. S. Van Dyke e na versão de Victor Fleming para “O Médico e o Monstro” (ambas de 1941), a atriz finalmente desponta
para o público ao esbanjar elegância neste clássico absoluto dirigido por
Michael Curtiz.
A história se desenvolve durante os conflitos iniciais da
Segunda Guerra Mundial, onde o americano expatriado Rick Blaine (Humphrey
Bogart) se mantém como o dono de um famoso bar em Casablanca, no Marrocos
Francês. A cidade é rota de fuga para àqueles que desejam escapar das
perseguições dos nazistas na Europa. Além de oferecer diversão para os mais ricos,
o Night Club de Blaine funciona como
um mercado negro, onde passes livres são vendidos a preços extremamente
salgados para os que buscam se exilar.
A noite caótica de Casablanca ainda revelaria uma
surpresa: quando Victor Laszlo (Paul Henreid), líder da resistência tcheca,
chega à cidade trazendo consigo sua esposa, Ilsa Lund (Bergman), Rick Blaine se
reencontra com um passado no qual ele relutava para esquecer. A dama era sua
antiga amante, o grande amor da sua vida que, de maneira inesperada, fora
interrompido há algum tempo, em Paris. Atender Lazlo e, consequentemente, Ilsa
poderá trazer para o negociante uma série de complicações imprevistas e um
turbilhão de confusões emocionais.
As atuações intensas e elegantes, bem como a química
entre Bergman e Bogart, são tão penetrantes aos olhos do espectador que o filme
se tornou um divisor de águas na carreira de ambos. Bogart finalmente se
consagrou como um dos maiores atores de sua geração (e de todos os tempos) e
Bergman emendou, já no ano seguinte, o clássico “Por quem os Sinos Dobram” (1943) de Sam Wood. Curiosamente, o
carisma e a simpatia do casal não foram reaproveitados em nenhum outro filme (atitude
que era muito comum por parte dos produtores executivos da época diante de um
grande sucesso) e os dois nunca voltaram a contracenar, embora tenham
construído, a partir de “Casablanca”,
uma intensa e duradoura amizade.
Humphrey Bogart com Ingrid Bergman em "Casablanca" (1942) de Michael Curtiz - Warner Bros. [us] |
Viagem à Itália (Viaggio in Italia, Itália | França, 1954)
Direção: Roberto
Rossellini
Quase sete anos de um casamento repleto de amor,
cumplicidade, três filhos e cinco filmes. Juntos, Ingrid Bergman e o diretor
italiano Roberto Rossellini formaram um dos casais mais inflamados, polêmicos e
escandalosos da história do cinema, afinal ambos se apaixonaram e iniciaram um
relacionamento quando ainda estavam casados com os seus respectivos pares. Por
fim, abandonaram (cada um) a sua família para poderem viver juntos. O
embaraçoso episódio fez com que Ingrid, acostumada e muito bem adaptada à
rotina de Hollywood, fosse forçada pelo governo estadunidense a deixar o país
acusada de adúltera e de mau exemplo para a sociedade e para as mulheres
americanas.
Sem poder filmar por anos nos Estados Unidos, mas bem
afastada dos escândalos em um “disfarçado exílio”, Ingrid Bergman pôde dar
novos rumos na carreira e participar de várias produções e coproduções europeias
na Alemanha Ocidental, na França, no Reino Unido e, sobretudo, na Itália. Na
mira das lentes do marido, a atriz brilhou em “Stromboli” (1950) e, dois anos mais tarde, em “Europa ‘51” (1952), ambos filmados na “Terra da Bota”. Entretanto,
é em “Viagem à Itália” que observamos
a sinergia do trabalho e do talento do casal confluir para uma obra-prima que
trata, curiosa e ironicamente, de uma crise conjugal. No filme acompanhamos
Katherine Joyce (Bergman) e Alexander “Alex” Joyce (George Sanders), um rico e
sofisticado casal britânico que segue para o Sul da Itália com a finalidade de
vender uma propriedade recentemente adquirida por herança de um falecido tio de
Alex.
Antes da viagem, a relação entre os dois já não caminhava
muito bem. O silêncio resignado que ampliava de maneira abissal a distância
entre o casal ressoou ainda mais grave quando eles entraram em contato com a
misteriosa e fantasmagórica Nápoles, bem como os seus peculiares habitantes.
Katherine começa a recordar de um poeta ao qual amou e que morreu durante a
Guerra e, além disso, mergulha no fascínio que os napolitanos têm pela morte ao
visitar os melancólicos museus da cidade e também de Pompeia; já Alex investe
em escapas mal-intencionadas para Ilha de Capri, aonde flerta com várias mulheres,
mas sempre tentando evitar o adultério; nos raros momentos de intimidade com Katherine,
Alex se mostra sarcástico; já com ele, ela é extremamente crítica.
Um drama verdadeiramente real incrementado por uma
paisagem inspiradora e ao mesmo tempo hostil, “Viagem à Itália” é a ilustração recalcada e simples de um par que
está cansado de levar adiante um casamento que, visivelmente, vai se
desintegrando aos olhos da sociedade. Pelas mãos e olhares do cineasta
italiano, a história dos Joyce é transformada em um apaixonado e lancinante
romance que recebe constantemente boas doses de cinismo, crueldade e,
principalmente, solidão. Vale lembrar que o desgaste e o distanciamento também
chegaram para Ingrid Bergman e Roberto Rossellini, que acabaram se divorciando
em 1957.
George Sanders com Ingrid Bergman em "Viaggio in Italia" (1954) de Roberto Rossellini Italia Film [it] | Junior Film [it] | Sveva Film [it] |
Sonata de Outono (Höstsonaten, França | Alemanha Ocidental
| Suécia, 1978)
Direção: Ingmar Bergman
Ao lado de Ingrid, o cineasta Ingmar Bergman também é considerado
o maior nome da história do Cinema Sueco. Apesar de possuírem o mesmo
sobrenome, os dois não tinham nenhuma relação de parentesco, e muito menos
haviam trabalhado juntos em algum filme até o ano de 1978, quando realizaram “Sonata de Outono”, primeira e única
contribuição entre a atriz e o diretor.
No longa, Ingrid interpreta Charlotte Andergast, uma
pianista profissional de carreira renomada e bem-sucedida que recebe uma carta
de sua filha, Eva (Liv Ullmann), a qual não vê há sete anos. Tímida e
reprimida, Eva anseia pelo amor da mãe, que por muito tempo negligenciou os
filhos e toda a família, mas que agora arrumou um tempo para visitá-la em sua
residência, localizada em uma afastada província da Suécia.
Num primeiro momento, a chegada de Charlotte reacende um
amedrontado sentimento de carinho e afetividade entre mãe e filha. Entretanto,
o encontro das duas mulheres começa a mudar de tom quando Charlotte se
surpreende com a presença de sua outra filha, Helena (Lena Nyman), na casa da
irmã mais velha. Helena é deficiente mental, e Eva a tomou para seus cuidados
retirando-a da instituição em que sua mãe a havia colocado pouco antes de
seguir a sua carreira internacional como música. A presença de Helena na casa
de Eva é somente o estopim de uma bomba de tensão que está prestes a explodir.
Assombrada por rancores, ressentimentos e cobranças
escondidas em lembranças do passado, a relação conflituosa entre mãe e filha se
reconstrói de maneira lenta e nervosa em um embate especioso. Interpondo um
confronto sustentado por um Prelúdio de Chopin, onde Charlotte impõe sua
superioridade e virtuosismo perante a filha, e uma conversa noturna em que Eva
libera todas as suas feras revelando a incapacidade afetiva da mãe ao lidar com
ela e com Helena, Ingmar Bergman tece uma das mais amargas reflexões sobre o intrincado
tema dos relacionamentos familiares.
Marcado por um desfecho sublime, “Sonata de Outono” também foi o último filme feito por Ingrid
Bergman para o cinema (a atriz ainda faria o telefilme “Golda”, em 1982, ano de seu falecimento). No início das filmagens,
ela tinha acabado de ser diagnosticada com câncer nas mamas, doença que tiraria
a vida de uma das maiores estrelas do cinema de todos tempos quatro anos depois,
coincidentemente, no dia de seu aniversário.
Liv Ullmann com Ingrid Bergman em "Höstsonaten" (1978) de Ingmar Bergman Personafilm [de] | Filmédis [fr] | Incorporated Television Company (ITC) [gb] | Suede Film |
É ISSO... CELEBREM INGRID BERGMAN!
BOM FIM DE SEMANA E BOAS SESSÕES!
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